segunda-feira, 13 de julho de 2009

somtidos

Devo minhas composições a um amigo querido.

Quando resolvi comprar meu primeiro instrumento musical não sabia o que era nota, tom, ritmo, escala, acorde ou qualquer outra palavra que pudesse estar em um dicionário de música. O cavaquinho era o escolhido. Os chorinhos eram paixões de infância.

O instrumento musical nasceu do tamanho de um bebê.

As aulas começaram logo depois e a primeira grande surpresa estava no olhar do professor. De apenas 15% da visão periférica era o que seus olhos podiam se gabar. Quando não se vê, se ouve. E logo aprendi que os sons, assim como as pessoas, se combinam. As convenções estão lá, mas esbarram na abstração completa do som, tão avassalador quanto um sentimento. Os sons amam e os sons choram. E fugindo às regras os sons podem se apaixonar.

Meu professor me ensinou a enxergar o som. E só assim eu pude ouvir bem alto o rosto rosado de uma menina envergonhada, pude ouvir bem alto as cores sem fim de um vestido que samba, pude ouvir bem alto o desenho que o corpo faz no pano.

As palavras são vistas. A visão é dita. Os dizeres, ouvidos.

Quando meu professor não estava, tinha o amigo. Este me dizia que seu conhecimento realmente verdadeiro era saber o nome de todos os Rolling Stones e de pronunciar com perfeição as difíceis fonéticas de “world” e “massachussetts”. Falar palavras difíceis é como retirar sons difíceis de um instrumento.

Meu amigo cantava serestas durante a aula. Todas elas com cinco ou seis vezes a minha idade. Mas elas eram novas para meus ouvidos, e assim comecei a entender a poesia da música, a palavra que é som, o som que é palavra, e como cantar pode fazer bem para uma vida.

Hoje meu amigo se despediu dos dedos no cavaquinho. Sem choro. Ficaram seus risos que são sons, seus gestos que são sons, seus ideais que são sons, sua simplicidade que é som, sua generosidade que é som, seu cavalheirismo que é som e sua inteligência que é som. Meu amigo assim como todas as coisas que são inesquecíveis, hoje se transformou numa doce e presente melodia.

(scapin)

Homenagem ao Lary, amigo e meu primeiro professor de música que faleceu hoje (13/07/2009) em Goiânia.

2 comentários:

Viviane Margarida disse...

Lindas palavras... e sons do coração!

Lary ainda vive em você, Octávio. E nos belos sons que vocês nos presenteiam.

"All that we love deeply becomes a part of us." (Helen Keller)

Abraços com carinho
Vivi

Anônimo disse...

Dentre as várias profissões que meu pai já atuou, a música, sem dúvida, foi a que melhor o promoveu. Foi nela que encontrou suas maiores riquezas: sua paz, sua ternura, sua alegria e seus maiores amigos!

Grato por suas palavras, seu carinho e sua amizade!
Claudio Gomes